quinta-feira, 8 de maio de 2008

Um grande γεια σασ à xôra dona Ιφιγένεια Κοντοκαλου...

...acabo de lhe pagar a penúltima renda da casa. A parte de pagar é a única coisa da qual não vou ter saudades, isso seria parvo, ainda é bastante dinheiro e custa-me carregar as notas no bolso.
Aqui na Grécia os pagamentos são feitos "à cigano". Cartões e máquinas são para maricas, aqui, paga-se com dinheiro vivo e a palavra vale mais do que um papel rubricado. Chamem-me cigano mas este é o meu tipo de relação de negócios. Cospe-se na mão, dá-se um bacalhau e é como se um laço invisível de fidelidade nos unisse.
De resto, acho que não podia ter encontrado melhor pessoa a quem pagar. Acabo por considerar a minha senhoria uma amiga (de 80 anos). Daquilo que me apercebi teve uma vida de luta, perseguida pelos nazis e outras coisas invulgares mas um bocado deprimentes. Não que ela se queixe particularmente mas deu para entender.
Histórias interessantes que ela contou todos os meses, sempre em grego, portanto o início não apanhei totalmente. Só a partir de 1939.
Pagar a renda acabou por se tornar um ritual menos penoso do que o habitual por causa da xôra dona Ιφιγένεια Κοντοκαλου, dos seus bolinhos caseiros, "fruta da aldeia" e, claro, das suas histórias (muitas delas sobre os seus bolinhos caseiros e "fruta da "aldeia"). Lembra-me uma vizinha que tenho em Lisboa, não sei bem porquê até porque não são nada parecidas agora que penso melhor nisso. Talvez sejam parecidas numa primeira abordagem... pouco importa.
Fico com a sensação de que é comuna. Embora não sendo comuna (sou de "esquerda", claro!) sempre gostei deles, não num sentido de "ahhh, tão giro, ainda acredita no Pai Natal!" mas no sentido de admirar quem acredita em valores bastante honestos, honrosos e luta por eles.
Utopias, talvez, mas uma utopia, por ser utopia, não deve ser desprezada nem desacreditada, pelo contrário, o mínimo que se pede a alguém verdadeiramente empenhado em mudar, para melhor, o estado actual das coisas é pensar em grande, fixar uma meta – tanto melhor – impossível e fazer o impossível para alcançá-la. Mesmo que não se atinja o objectivo traçado, caminhou-se no sentido desejável e aos poucos a utopia torna-se realidade. Talvez seja por isto que a senhora Ιφιγένεια Κοντοκαλου me pareça comuna... provavelmente não gosta de política (no próximo mês tenho de lhe perguntar, é a minha última chance!).
São coisas triviais mas, daqui a uns tempos, vou poder fechar os olhos, saborear petiscos e ouvir mais histórias interessantes... "Que bolos e petiscos ela vai fazer no próximo mês? Aposto que vai ser algo em grande, a Ιφιγένεια sabe bem!" Não interessa, paciência, da próxima vez que ler isto já saberei a resposta...

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